sexta-feira, 27 de maio de 2011

Passe

Penso que posso, logo, não penso, posso.
Passo o que penso logo que posso.
Logo, não passo, posso.

Passo o que posso logo que penso.
Logo, não penso.

sábado, 17 de julho de 2010

Tudo que molha seca

Tempo. Dizem que tudo cura, tudo apaga, tudo muda, tudo move. Exceto a morte. E os impostos.
Ele transborda pelos nossos dedos, passa pelo peito, escorre pela perna, até parar nos pés e ir embora.

Na mitologia, Cronus devorava os seus. Devora a mim agora. Lentamente. Deixo que devore. Leve esse peso que eu mesma não suporto. Leve e me torne leve.

Devora lentamente cada angústia, cada passo em falso, cada histeria incontida nesse peito já tão dolorido e transtornado. Não deixa a emoção ofuscar a razão e atropelar-me novamente.

Logo eu, que sempre achei tão racional tudo o que sentia. Refém agora do que sinto, faço meus pensamentos de cúmplices para justificar cada gesto impensado. Logo eu, que pensava em tudo.

Devora-me, na surdina, leva-me. Escorra e me molhe.

Se não é possível voltar no tempo, peço apenas para correr para frente. Rápido, indolor. Racionalmente.

domingo, 25 de outubro de 2009

Sophia

O céu da boca tem o gosto acre daquela tarde saudosamente tristonha que ainda é recente. O vi, mas não ouvi, nem decifrei, nem descobri nada. Novamente estávamos separados, mesmo estando lado a lado.

É estranho, porque antes te sentia perto, mesmo estando meses e quilometros de distância. A gente se encontrava frequentemente nas vielas da vida, nas esquinas do subconsciente, nos terminais da imaginação.

E assim ficamos os dois: terminal. Perdidos e encontrados num terminal. E terminal também é nosso estado. Como o do coelhinho Teddy que foi parar na fazendinha devido ao câncer em uma cena que jamais esquecerei.

Não quero que seja para sempre, mas aquele carioca bem disse, provavelmente depois de alguns goles ou garrafas de uísque: "que seja infinito enquanto dure".

Estou pedindo demais, eu sei. Desconsidere. Leve em consideração só o que quer e eu pretendo fazer o mesmo. Só quero que se lembre aos seus 84 anos que um dia, alguém realmente se dispôs a gostar demasiadamente do seu jeito, mas que foi vetado por ele mesmo. E quando conhecer o diretor do filme que é a sua vida, não reclame da falta de romance, do fator Meg Ryan em sua vida.

Fiz do fato um ponto irracional e agora não quero mais pensar. Nem nisso, nem naquilo, nem no que está por vir. Sei que tudo está no roteiro, que tudo faz parte de um sistema rotineiro de crescer. E eu cresço e desapareço, como um buraco negro de dúvidas, teorias e hipóteses que nem Sócrates e nem Focault saberiam exemplificar. E nem mesmo Schopenhauer com sua metafísica do amor.

domingo, 30 de agosto de 2009

Logicamente

Apesar de alucinar, o pensamento evita em muitos casos o sofrimento. Bem dizia minha avó: "Quando a cabeça não pensa, o corpo padece". O raciocínio lógico, desprovido de emoções, que permite a construção de naves espaciais e a confecção de bolas de golfe, principalmente, é um dos maiores narcóticos do mundo. E evita o sofrimento.

Usando a mente, não o coração, chegamos a lua. E chegando na lua, nosso coração acelerou. Talvez por isso ainda estejamos na Terra, almejando o espaço. Deixamos o pensamento lógico por uma paixão.

Dizem que a paixão é uma coisa boa. Faz a vida pesar menos e o coração mais. Mas mais do que isso: faz a gente esquecer do pensamento lógico. Diante do objeto que desperta esse arrepio na beira da espinha, o frio no estômago e febre interna, esquecemos toda lógica. É impossível somar ou subtrair, quiçá dividir ou multiplicar.

Agora chegamos ao ponto: para não sofrer, precisamos pensar. Para não sermos vítimas da paixão, precisamos da lógica. Só ignoramos novamente o fato de que o tórax é maior que a cabeça, e que quando ele lateja, a lógica se dispersa. Se perde em algum lugar do eu. E o corpo começa a padecer.

Ausência de fome, falta de sono, excesso de euforia, histeria, nostalgia e muitas outras coisas com o sufixo "ia" que só quem já sentiu entende.

Deixe o corpo para lá, ele vai padecer mesmo. Com o tempo, com a morte, e principalmente, com a vida. Fique com a mente. Ou pelo menos, tente.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

A cabeça e o tórax

A pessoa que um dia disse que era fácil gostar de alguém estava embriagada. É bem difícil. Principalmente com a convivência diária, com as conveniências, com os defeitos latentes e aquelas coisas feitas somente para irritar.

Sábio é o que disse que não dá para mandar no coração. Esse sim merecia todos os louros e citações em todos os livros. Aliás, essa metáfora de coração veio bem a calhar. Porque quando dói de verdade, é nele, é bem no centro do peito, aquele aperto enorme que faz a gente se esquecer de como se respira.

Até pouco tempo, era muito fácil. Gosta ou não gosta. Daí nós crescemos, aprendemos a conviver com as diferenças. Você começa gostando, acha que deixou de gostar, mas para sempre vai gostar. Mesmo não gostando de gostar do jeito que gosta.

E deixar de gostar leva tempo. Mais do que gostar. Tem coisa que a gente nem precisa ver para saber que gosta. Ou ver uma vez, e pronto, gostar demasiadamente. Mas e aquelas que a gente gosta há tanto tempo? E por alguma razão precisamos deixar de gostar. E como disse Proust: "Quando a dor acaba questionamos se realmente amamos". Mas amamos. De uma forma fraternal, sem febre e sem aquela angústia típicamente jovem, mas que vem em qualquer idade.

Quanto tempo leva até dar o tempo certo? E quando dá certo, como sabemos? O certo pode ser temporário?

Pense. Cá fico eu, pensando também.

Mas deixo a dica: o tórax é maior que a cabeça porque aguenta mais dores.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Penso, logo não durmo

Disseram que matuto demais. Eu fico pensando demais nas coisas grandes e pequenas do mundo e da minha vida e sou menos tranquila por isso. Fato.

Eu penso demais. E durmo de menos. Isso é quase como uma afirmação irrevogável: pessoas que pensam demais dormem de menos. Fato².

Na madrugada que transcorre, o excesso vira falta e a falta, fica em excesso. Pisca, vira, pensa. Pensa demais. E fica pensando em como parar de pensar.

Pensa no dia de hoje, no amanhã, no mesmo período do ano passado e no futuro. Por que todas as questões insolúveis e inúteis vagueiam mais livremente quando encostamos no travesseiro nossas pesadas cabeças calejadas por um cérebro inchado de tanta atividade? Não pense nisso.

Durma. No sono, tudo se resolve, bem diz minha sagrada mãe.

Quem dorme sara, cura-se de todo o mal. Os pensamentos viram sonhos, e lá, você é quem quer ser.

E eu, aqui acordada, sou quem menos quero ser.

Continuo pensando nisso.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Reticências

Passadas algumas semanas na reabilitação intelectual (meios externos acabaram por viciar-me), retorno com a tarefa semanal reflexiva.

Hoje é terça e não a sexta, mas quem pensa demais perde a noção do tempo. Nota: pensar demais não está relacionado diretamente à reflexão e nem é um sinônimo que de tenho pensado puramente, de que pensar demais é um bom sinal ou que quem pensa pouco não é brilhante. Ao contrário. Creio eu que quando menos tempo levamos em nossas reflexões, mais brilhantes somos.
Horas de reflexão são para pensadores amadores, exercícios para atingir o tal do esclarecimento que Kant citou certa vez. Fim da nota.

Meu ponto hoje é supôr o que pensam as pessoas em momentos banais. No ônibus há sempre os vagueantes olhando o nada. Que estariam eles pensando?
Eu sou uma deles, diga-se de passagem.

Que estaria aquele mendigo do metrô, que passa o dia inteiro sentado lá, pensando?
Aquele vendedor ambulante de doces/aparelhos eletrônicos/bolsas/meias/cintos e passes de ônibus pensando?

E aquele empresário de terno, que espia a rua de dentro do restaurante japonês caro, com sua Sansonite ao lado, com seu N95 do outro, que estaria ele pensando?


Pensando também fico eu, cá, desolada desse lado.